Eram beijos de fogo, eram de
lavas,
e sabiam a sonhos e ambrosias.
Como pensar que a boca com que
os dava
era a mesma afinal com que
mentias?
Se eras as mais humilde das
escravas
em dádivas, anseios, alegrias,
- como prever que o amor que me
juravas
seria mais uma das tuas heresias
?
Como supor ser tudo um falso
jogo?
E crer que se extinguisse aquele
fogo
que acendia em teus olhos duas
piras?
E descobrir, - no instante em
que me amavas, -
que em tua boca ansiosa
misturavas
ao mesmo tempo beijos e mentiras
?
Eram brancas as mãos, brancas e
puras,
mãos de lã, de pelúcia, mãos
amadas...
Como prever, vendo-as fazer
ternuras,
que nas unhas traziam emboscadas
?
Era tão doce o olhar... em
conjeturas
felizes, e em promessas
impensadas...
Como enxergar, portanto, as
amarguras
e as frias traições nele
guardadas ?
Como pensar em duas, se somente
uma eu tinha em meus braços, e
adorava,
e a outra, - uma impostora, - se
mantinha ausente.
E, afinal, como ver, nessa
alegria,
que o amor que tanta Vida me
ofertava
seria o mesmo que me mataria ?
( Poema de JG de Araujo Jorge
extraído do livro Epera- 1960 )